domingo, 12 de dezembro de 2010

Perda difícil


Aborto espontâneo é relativamente comum e atinge 15 % das gestações. Saiba como enfrentar a situação
e o medo de uma nova gravidez

Por Camila Silveira


Apesar de ser relativamente comum, já que, segundo especialistas, ocorre em 15% das gestações, o aborto espontâneo é uma experiência delicada que pode abalar o lado emocional da mulher. Em alguns casos, ela pode desenvolver um certo receio em engravidar novamente ou então de contar para as pessoas sobre uma nova gravidez. Além disso, a situação pode desencadear alguns quadros depressivos.

"O aborto espontâneo pode ter várias causas, sendo que a mais comum é embrionária, ou seja, alterações cromossômicas do embrião. Existe também o fator hormonal, uma ocorrência chamada Insuficiência de Corpo Lúteo, que é quando o feto não encontra progesterona e estrógeno suficientes para se instalar", diz o ginecologista, especialista em medicina reprodutiva e diretor do Fertility (Centro de Fertilização Assistida), Assumpto Iaconelli.

Segundo Iaconelli, esse problema ocorre com mais frequência até a 12ª semana de gestação. "Quanto mais tardio, mais raro é o abortamento. Depois desse período, as causas geralmente são outras, como diabetes, hipertensão, enfim, alguma patologia mais ligada à gravidez do que ao embrião", explica. O especialista diz que esse tipo de aborto praticamente não traz riscos, pois não houve manipulação intrauterina, diferente daqueles que são provocados.


Superando o trauma

De acordo com a psicóloga Maria Cristina Capobianco, cada pessoa vai lidar com esse momento de forma diferente. As reações vão ser influenciadas pela história de vida e da estrutura familiar da mulher. "O momento também vai influenciar muito. Se ela tem uma boa estrutura, se está feliz, se tem uma relação estável. São vários os fatores que determinam o comportamento da mulher diante do ocorrido", explica.

Para se defender, segundo a psicóloga, algumas pessoas negam completamente qualquer perda, como se nada tivesse acontecido. "Aparentemente, parece que ela nem está sentindo nada, mas, muitas vezes, isso não é um bem-estar, mas somente uma defesa. Provavelmente, está sofrendo muito", diz. Para Maria, a reação mais natural é uma certa tristeza, mas isso depende muito também do período da gestação, pois quanto mais tempo, maior a ligação com o futuro bebê.

A especialista explica que é importante passar pelo luto e ficar um pouco deprimida, uma vez que na sociedade moderna, muitas vezes, os conflitos não são enfrentados. "É interessante fazer terapia para ter consciência de todos os mecanismos do inconsciente. Caso contrário, a pessoa pode ter mais dificuldade para engravidar por medo de perder. O acompanhamento de um psicólogo é necessário para não causar mais estragos", afirma.


Sem culpa

Outro sentimento que é recorrente nos casos de aborto espontâneo é a culpa. Diferente dos outros tipos de perda, muitas vezes, a mulher sente-se culpada pelo ocorrido. "O tema da culpa é muito comum e constante, independente do caso. É como se ela tivesse feito algo de negativo em algum momento e estivesse sendo castigada por isso", afirma o psicólogo Paulo Tessarioli. Nesse contexto, a perda é vista como uma condenação por ela.

Geralmente, esse assunto é trabalhado muito mal por todos os envolvidos e se transforma praticamente em um segredo. "Torna-se um tema que não vem à tona e que não é discutido. Ninguém fala sobre o que aconteceu. Esse comportamento já reforça a sensação de culpa. Todos precisam de um preparo emocional para lidar com essa questão", diz Tessarioli.

Para enfrentar a situação, o indicado é um acompanhamento psicoterápico, pois, caso contrário, qualquer gravidez posterior pode ser um trauma. "O aborto pode se tornar um fantasma na vida da pessoa. Uma mulher que passou por essa experiência pode colocar o assunto em uma "caixa" e jogar a chave fora, mas mais cedo ou mais tarde isso pode vir à tona e aparecer em situações do cotidiano", alerta.


Acompanhamento terapêutico

Assim, para o especialista, o primeiro passo é procurar ajuda. Depois, é necessário falar sobre o assunto. "O aborto espontâneo não trabalhado pode ser condição para o surgimento de uma depressão. Ela pode ter um quadro depressivo antes, durante e depois da gravidez. Por isso, o luto é necessário para a superação da perda, até para aqueles que acontecem nas primeiras semanas de gestação, pois não deixam de ser a morte de um sonho", diz.

Depois do impacto emocional e de atingir a aceitação, a mulher pode engravidar novamente sem receios. "O problema dessas experiências traumáticas é quando elas impactam a vida de tal forma que prejudicam o presente e inviabilizam o futuro. Essa é a medida para saber se algo precisa ser trabalhado emocionalmente. Quando você nota que algo não ficou no passado, é preciso olhar para a situação", constata.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Gostaria de saber sua opinião.